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Bem-vindos à Travessia de Caronte.
O chá está quente, os cookies estão frescos, e os mortos estão apenas de passagem.Wallace Price só conhece três coisas na vida: trabalho, um pouco mais de trabalho e algumas pitadas de trabalho. Assim, é extremamente inconveniente quando ele tem de parar tudo e atender ao seu próprio funeral. Mas quando ele recebe a visita de Mei, uma Ceifadora, ele começa a ter uma leve desconfiança de que possa estar morto.
Em vez de levá-lo diretamente ao além, ela o guia a uma pequena vila em cujos arredores, escondida entre as montanhas, fica uma peculiar casa de chá. E quando Hugo, seu carismático proprietário e barqueiro do além-vida, se oferece para ajudá-lo a fazer a travessia, ele decide que efetivamente deve estar morto.
Mas Wallace não está pronto para abandonar a vida que mal viveu e recebe uma última chance. Sete dias. Uma semana para viver uma vida inteira e talvez, enfim, apaixonar-se pelo que ela pode proporcionar. Às vezes, a morte é só o começo…
Hilário, comovente e acolhedor, Além da porta sussurrante é uma história inspiradora sobre viver dentro de um escritório e passar a morte construindo um lar.
Meu primeiro contato com JK TLune foi no ano passado, quando li A Casa no Mar Cerúleo foi, sem dúvida, o livro mais incrível que li em 2024, e me apaixonei pela escrita sensível e cativante do autor. Por isso, desta vez, mergulhei em Além da Porta Sussurrante. A morte sempre foi um tema delicado na vida de todo mundo, quase um tabu — afinal, acho que ninguém se sente totalmente confortável falando sobre isso, não é? Mas, se eu pudesse resumir meu sentimento em uma frase, diria que é o medo do desconhecido. E foi justamente com a morte que TJ Klune abordou de uma forma tão humana e tocante, transformando-o em uma jornada de aceitação e beleza.
Aqui, a morte é tratada de uma maneira que não se trata necessariamente de um fim, mas sim de uma continuidade da vida. JK Tlune tem uma delicadeza de tecer suas narrativas de uma forma tão perfeita que no final de suas histórias, é impossível você sair imune as reflexões e ensinamentos.
Neste livro temos o protagonista Wallace Price, um advogado workaholic que só pensava em si e era completamente egocêntrico e arrogante, muitas vezes até cruel, você já começa o livro odiando ele, mas após sua morte inesperada, ele embarca em uma jornada de autoconhecimento e transformação e é aí que mora toda a graça do livro, porque da maneira como autor inseriu o cenário a narrativa, foi simplesmente genial.
A história nos leva a questionar o que realmente importa na vida. Wallace, preso à sua rotina frenética e ambiciosa, negligenciava os relacionamentos e a própria felicidade. Após a morte, ele tem a oportunidade de repensar suas escolhas e prioridades. (Eu destaquei tantas quotes nesse livro que faço questão de colocar todas aqui porque quero ter essas frases salvas.)
Além da Porta Sussurrante é repleto de sensibilidade e humor (e acredite, o humor é na dosagens certa), criando personagens cativantes e situações emocionantes. A relação de Wallace com Hugo, o dono da funerária, e Mei, a ceifadora, e Nelson – avô de Hugo que é um espírito que vive na casa de chá, é um dos pontos altos do livro, mostrando com diálogos incríveis a importância da conexão humana e do amor em suas diversas formas. Também achei muito interessante a conexão dos personagens com o Gerente, da forma como eles o viam e até mesmo temiam, mas não vou elaborar mais para não soltar nenhum spoiler.
O livro nos faz refletir sobre a brevidade da vida e a importância de viver cada momento com intensidade. O autor aborda a morte com leveza e sensibilidade, sem ser mórbido ou triste, mostrando que a morte não é o fim, mas sim uma continuação da jornada da vida. A evolução do personagem de Wallace, que aprende a dar valor às pequenas coisas e aos relacionamentos é tocante, e eu diria que a mensagem principal do livro é que nunca é tarde para mudar e encontrar a felicidade, mesmo que seja “além da porta”.
“- Como foi a viagem, querida? Você se perdeu um pouco, não foi?
– Sim – respondeu Mei – O mundo é maior do que eu me lembrava, ainda mais indo sozinha.
– Geralmente é – falou Hugo. – É aí que mora a beleza. Mas você está em casa agora, então não se preocupe. Espero que não seja enviada de novo tão cedo.”
“O luto, Wallace sabia, tinha o poder de consumir, de corroer até que não restasse nada além de ossos ocos. Ah, a forma da pessoa permanecia igual, mesmo que as bochechas ficassem amareladas e olheiras se formassem sob os olhos. Encovados e deixados em forma bruta, eles ainda eram claramente humanos. Vinha em etapas, algumas menores que outras, mas inegáveis.”
“Você não está vivo, Wallace. Mas ainda existe. Acho que não percebeu isso até hoje.”
“Estou morto. Não tem como voltar. Um rio só se move em uma direção”
“A luz do sol se infiltrava pelas árvores, derretendo a fina camada de gelo no chão. Ele agarrou o corrimão conforme a luz se estendia em sua direção. A luz tocou suas mãos primeiro. E, então, os punhos, braços e, finalmente, o rosto. Aquilo o aqueceu e o acalmou. Ele esperava que, aonde quer que fosse, ainda houvesse o sol, a lua e as estrelas. Havia passado a maior parte da vida de cabeça baixa. Parecia justo que a eternidade lhe permitisse erguer o rosto para o céu.”
“Ela não se foi. Não de verdade. Apenas… seguiu em frente.”
“Nunca é suficiente, é? O tempo. Sempre achamos que temos muito dele, mas, quando realmente nos damos conta, não temos o suficiente.”
“Apenas partículas de poeira ao longo de um trecho de estrada na montanha, cinzas espalhadas como se ele tivesse importância. E talvez tivesse. Não para o mundo em geral, não para muitas pessoas, mas ali, naquele lugar? Com Hugo, Mei, Apollo e Nelson? Sim, pensou que talvez fosse importante afinal, uma lição sobre o inesperado. Não era esse o objetivo? Não era essa a grande resposta para o mistério da vida? Aproveitar ao máximo o que se tem enquanto se tem, o bom e o mau, o belo e o feio.”
“Na morte, Wallace nunca se sentira tão vivo.”
Livro favoritado pros livros da vida. Recomendo demais. 5/5:
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